sábado, 7 de novembro de 2009

Onde começa a falácia do relativismo moral

Todo o problema está nisso. Os homens têm uma natureza comum? Participam de uma essência idêntica que se diversifica em cada indivíduo? Para nós, que cremos numa origem e num fim eternos do homem, a questão não apresenta dificuldade. A permanência dos valores da cultura se prende às constantes da natureza humana, criada à imagem de um Deus infinito e eterno.

Essas constantes se referem antes de tudo ao Ser e em seguida a esses atributos do Ser que chamamos transcendentais e que são o verdadeiro, o belo, o bem. Esses valores, imutáveis e irrecusáveis em sua fonte e dos quais a cultura não apresenta senão um dos múltiplos aspectos, não os possuímos aqui embaixo a não ser de uma maneira imperfeita e fragmentária---o que fornece um argumento aos relativistas e aos céticos para contestar-lhes o fundamento. O que nos parece verdadeiro, o belo e o bem em tal tempo ou em tal lugar nos parecerá falso, disforme ou mau em tal outro tempo ou em tal outro lugar. Nossa visão dos transcendentais é como uma cota mal talhada, reflexo de um medida ideal de que trazemos em nós a marca confusa, mas indelével. Se assim não fosse como poderíamos julgar de suas deformações? Quando um Pascal nos diz por exemplo: "verdade aquém dos Pirineus, erro além" ou "engraçada justiça que um ribeirão limita", é que ele pressente uma verdade e uma justiça superiores para as quais, conforme as palavras de Luís XIV "não há Pirineus". Esses valores supremos podemos esmigalhá-los e prostitui-los ao infinito por fraqueza de espírito, conformismo ou fanatismo, mas não podemos aniquilá-los, porque, como o diamante só se talha por si mesmo, é ainda a eles que devemos referir-nos para contestá-los ou recusá-los.

É em nome da verdade que se decreta que não há verdade. Eu penso aqui numa peça de Thierry Maulnier na qual um filósofo proclama que nossa época chegou à certeza de que a palavra verdade não significa mais nada. Ao que uma jovem adolescente responde com entusiamo: "Como é verdadeiro isso!"

Gustave Thibon, Les valeurs permanentes de la culture, in "Actes du Congrès de Lausanne - V", Paris 1969

Fonte: Revista Hora Presente (número 7, outubro de 1970)