O medo e a inveja são dois sentimentos muito humanos, demasiado humanos, ai de nós!, de que ninguém está totalmente isento. Que homem, perscrutando o fundo da sua consciência, poderá dizer sem mentir que nunca teve medo e que nunca sentiu uma sombra de despeito, diante da superioridade ou do êxito do próximo? Mas estes defeitos têm isto de particular: quase ninguém ousa reconhecê-los diante dos outros nem mesmo confessá-los no interior de si mesmo. Apelo aqui para a experiência de cada um.
Todos os dias ouvimos pessoas confessarem-se sem dificuldade deste ou daquele comportamento condenado pela moral. Por exemplo, da propensão para a cólera ("eu cá não deixo ninguém pôr-me o pé sobre o pescoço") ou para a gula (as histórias de "comilões a toda a prova" abundam nas conversas) ou ainda para os pecados da carne. E não só confessam esses excessos, como até chegam a glorificar-se deles. A este propósito, conta-se o caso de um marselhês a quem o sacerdote perguntou, na confissão: "nunca enganou a sua mulher?", tendo ele respondido: -"Senhor prior, eu vim aqui acusar-me e não gabar-me!"
Mas já alguém ouviu um homem declarar: sou um covarde e encolho-me ao menor perigo? Ou ainda: sou um invejoso e as vantagens do próximo são intoleráveis para mim? Porque acontece assim? Muito simplesmente porque os outros defeitos podem ser atribuídos a um excesso de vitalidade mal dirigido, ao passo que o medo e a inveja são índice não só de fraqueza moral, mas também de inferioridade de natureza. E disto ninguém gosta de confessar-se...
Assim, para escapar a esta confissão de inferioridade, demasiado dolorosa para o seu amor-próprio, o covarde e o invejoso reagem disfarçando estes sentimentos miseráveis sob formas menos humilhantes, isto é, segundo a análise cruel de Nietzsche, dando-lhes a cor de virtude e de ideal.
O medo reveste, por exemplo, a máscara do pacifismo. O covarde mostra-se cheio de consideração e de compreensão para o adversário que o enfrenta ameaçador, faz-lhe todas as concessões possíveis, em nome da paz internacional ou social---pronto a esmagá-lo, quando a sorte o abandonar. Conheço um dos nossos célebres intelectuais franceses (cujo nome me abstenho de citar) que, aterrorizado pela invasão alemã, em 1940, fez o elogio da ordem nazi e, não menos cheio de medo, em 1945, ante a ameaça comunista, converteu-se em fervoroso apologista do entendimento com a Rússia, por qualquer preço. O medo tinha mudado de objeto, mas não de natureza. Quanto à inveja, ela manifesta-se em política sob o véu do igualitarismo, que confunde com a vontade de justiça.
A reação do invejoso diante de tudo o que lhe é superior resume-se nisto: "independentemente do que sejas, não vales mais do que eu e, se tens mais do que eu ou se pareces ser mais do que eu, é por um favor imerecido da nossa má organização social, que há-de ser varrida amanhã pela justiça revolucionária".
É inútil sublinhar a importância deste fator dissolvente nas nossas pseudodemocracias... Estes passadores de moeda-falsa intelectual e moral são, uma vez mais, a prova da miséria do homem. Miséria da fraqueza e do egoísmo, intolerável para o orgulho, que o homem dissimula e justifica sob as aparências lisonjeiras da mentira. Os nossos vícios mais perigosos são os que disfarçamos de virtudes.
Fonte: viriatos.blogspot.com
Todos os dias ouvimos pessoas confessarem-se sem dificuldade deste ou daquele comportamento condenado pela moral. Por exemplo, da propensão para a cólera ("eu cá não deixo ninguém pôr-me o pé sobre o pescoço") ou para a gula (as histórias de "comilões a toda a prova" abundam nas conversas) ou ainda para os pecados da carne. E não só confessam esses excessos, como até chegam a glorificar-se deles. A este propósito, conta-se o caso de um marselhês a quem o sacerdote perguntou, na confissão: "nunca enganou a sua mulher?", tendo ele respondido: -"Senhor prior, eu vim aqui acusar-me e não gabar-me!"
Mas já alguém ouviu um homem declarar: sou um covarde e encolho-me ao menor perigo? Ou ainda: sou um invejoso e as vantagens do próximo são intoleráveis para mim? Porque acontece assim? Muito simplesmente porque os outros defeitos podem ser atribuídos a um excesso de vitalidade mal dirigido, ao passo que o medo e a inveja são índice não só de fraqueza moral, mas também de inferioridade de natureza. E disto ninguém gosta de confessar-se...
Assim, para escapar a esta confissão de inferioridade, demasiado dolorosa para o seu amor-próprio, o covarde e o invejoso reagem disfarçando estes sentimentos miseráveis sob formas menos humilhantes, isto é, segundo a análise cruel de Nietzsche, dando-lhes a cor de virtude e de ideal.
O medo reveste, por exemplo, a máscara do pacifismo. O covarde mostra-se cheio de consideração e de compreensão para o adversário que o enfrenta ameaçador, faz-lhe todas as concessões possíveis, em nome da paz internacional ou social---pronto a esmagá-lo, quando a sorte o abandonar. Conheço um dos nossos célebres intelectuais franceses (cujo nome me abstenho de citar) que, aterrorizado pela invasão alemã, em 1940, fez o elogio da ordem nazi e, não menos cheio de medo, em 1945, ante a ameaça comunista, converteu-se em fervoroso apologista do entendimento com a Rússia, por qualquer preço. O medo tinha mudado de objeto, mas não de natureza. Quanto à inveja, ela manifesta-se em política sob o véu do igualitarismo, que confunde com a vontade de justiça.
A reação do invejoso diante de tudo o que lhe é superior resume-se nisto: "independentemente do que sejas, não vales mais do que eu e, se tens mais do que eu ou se pareces ser mais do que eu, é por um favor imerecido da nossa má organização social, que há-de ser varrida amanhã pela justiça revolucionária".
É inútil sublinhar a importância deste fator dissolvente nas nossas pseudodemocracias... Estes passadores de moeda-falsa intelectual e moral são, uma vez mais, a prova da miséria do homem. Miséria da fraqueza e do egoísmo, intolerável para o orgulho, que o homem dissimula e justifica sob as aparências lisonjeiras da mentira. Os nossos vícios mais perigosos são os que disfarçamos de virtudes.
Fonte: viriatos.blogspot.com