Um padre americano contou-me recentemente a história seguinte: recebera a visita de dois adolescentes num estado de extrema agitação. Julgavam-se possessos do demônio e pediram-lhe para os exorcizar. Como nunca lhe tinham feito tal pedido, começou por manifestar algum ceticismo sobre o que os jovens afirmavam. Compreendeu tudo, quando eles lhe confessaram que tinham assistido, alguns dias antes, à projeção do filme de horror intitulado "O exorcista".
"Acabei --- contou-me ele --- por praticar sobre eles, com a maior solenidade possível, os ritos do exorcismo e eles foram-se embora livres da sua obsessão. Mas pergunto a mim próprio se não se tratava de um simples fenômeno de auto-sugestão..."
Sugestão ou não --- respondi-lhe --- acho que procedeu muito bem, porque era verdadeiramente do diabo que se tratava. Não, sem dúvida, de um caso em que o demônio possuia diretamente uma pessoa, mas sim do espírito do mal que sopra através do mundo e penetra nas almas através dos meios de comunicação social. Em suma, um demônio sociológico, adaptado à era das multidões...
Digamos que estes jovens que se julgavam possessos tinham "somatizado" a emoção violenta provocada por um espectáculo de terror. O que nos conduz a reflexões mais gerais sobre o fenômeno da projeção no corpo das perturbações da alma, ao qual um dos nossos grandes médicos atribuía recentemente a origem de pelo menos cinquenta por cento das doenças consideradas orgânicas: asma, eczema, úlcera gástrica, cardiopatia, etc. Daqui a necessidade de os médicos que se preocupam com a eficácia saberem tanto de psicologia como de fisiologia.
Admite-se, portanto, cada vez mais, sob a pressão crescente dos fatos, que a alma é senhora do corpo, que o plasma, se assim posso dizer, à sua imagem, uma vez que perturba o funcionamento do corpo em função do seu próprio desregramento.
Mas qual é então a causa da má vontade ou da suspeita que tão facilmente incide sobre o bem fundado da influência contrária --- a influência da alma sobre os mecanismos e as pulsões do corpo, a fim de os regular e de os orientar em função de um ideal moral ou religioso?
Uma imensa corrente de opinião, que tem origem no culto aviltante do prazer e da facilidade, tende a repelir, como contrárias à plenitude do ser humano e como causas de recalcamento e de frustração, todas as formas de ascese e de disciplina que o espírito impõe à carne. É neste sentido que alguns condenam, em nome da espontaneidade e da criatividade da criança, a parte de aprendizagem e de disciplina que a educação comporta e que identificam, em matéria sexual, o ideal de castidade com recalcamento...
"É lesar os direitos do corpo impor a castidade aos adolescentes" --- dizia-me uma educadora, embebida até á medula de liberalismo moral e, por outro lado, eminentemente favorável ao aborto e à pílula.
Eis como lhe respondi: "O corpo não tem direitos, mas funções. É à alma que pertence coordenar essas funções com vista a realizar um equilíbrio ótimo entre a vida animal, a vida espiritual e as exigências do meio social. Que isso implica uma parte de violência em relação às pulsões carnais, é algo a que dou o meu acordo sem receio. E também concordo que certas castidades mal integradas provocam recalcamentos. Mas o recurso ao aborto ou à pílula, que você preconiza, como contrapartida da liberdade sexual, não é também um atentado contra esses famosos "direitos" do corpo? É a carne que reclama a interrupção da gravidez ou o impedimento da fecundidade? Pelo contrário, ela só quer levar até ao fim o processo natural que vai da união conjugal ao nascimento. Não, essas intervenções mutilantes procedem de um frio cálculo do espírito, ávido de tirar do corpo o máximo de gozo, sem ter em consideração as consequências naturais do prazer. Nesse caso, intervenção por intervenção, prefiro a da moral sexual..."
Assim, como quer que se proceda, nunca se escapa ao domínio da alma sobre o corpo. Todo o problema está em saber qual o sentido em que esse domínio se exerce.
Mens sana in corpore sano (alma sã em corpo são) --- diziam os antigos. Sabemos demasiado bem que as doenças da alma se repercutem sobre o corpo; por isso, é preciso velar pela saúde da alma, a fim de que ela tenha, em sentido contrário, as mesmas repercussões --- por outras palavras, substituir o psicossomatismo do erro e do mal pelo da verdade e do bem.
Fonte: viriatos.blogspot.com
Artigo original em francês:
"Le psychosomatisme" - Revista "Itinéraires" (Billets - 22 octobre 1976)
"Acabei --- contou-me ele --- por praticar sobre eles, com a maior solenidade possível, os ritos do exorcismo e eles foram-se embora livres da sua obsessão. Mas pergunto a mim próprio se não se tratava de um simples fenômeno de auto-sugestão..."
Sugestão ou não --- respondi-lhe --- acho que procedeu muito bem, porque era verdadeiramente do diabo que se tratava. Não, sem dúvida, de um caso em que o demônio possuia diretamente uma pessoa, mas sim do espírito do mal que sopra através do mundo e penetra nas almas através dos meios de comunicação social. Em suma, um demônio sociológico, adaptado à era das multidões...
Digamos que estes jovens que se julgavam possessos tinham "somatizado" a emoção violenta provocada por um espectáculo de terror. O que nos conduz a reflexões mais gerais sobre o fenômeno da projeção no corpo das perturbações da alma, ao qual um dos nossos grandes médicos atribuía recentemente a origem de pelo menos cinquenta por cento das doenças consideradas orgânicas: asma, eczema, úlcera gástrica, cardiopatia, etc. Daqui a necessidade de os médicos que se preocupam com a eficácia saberem tanto de psicologia como de fisiologia.
Admite-se, portanto, cada vez mais, sob a pressão crescente dos fatos, que a alma é senhora do corpo, que o plasma, se assim posso dizer, à sua imagem, uma vez que perturba o funcionamento do corpo em função do seu próprio desregramento.
Mas qual é então a causa da má vontade ou da suspeita que tão facilmente incide sobre o bem fundado da influência contrária --- a influência da alma sobre os mecanismos e as pulsões do corpo, a fim de os regular e de os orientar em função de um ideal moral ou religioso?
Uma imensa corrente de opinião, que tem origem no culto aviltante do prazer e da facilidade, tende a repelir, como contrárias à plenitude do ser humano e como causas de recalcamento e de frustração, todas as formas de ascese e de disciplina que o espírito impõe à carne. É neste sentido que alguns condenam, em nome da espontaneidade e da criatividade da criança, a parte de aprendizagem e de disciplina que a educação comporta e que identificam, em matéria sexual, o ideal de castidade com recalcamento...
"É lesar os direitos do corpo impor a castidade aos adolescentes" --- dizia-me uma educadora, embebida até á medula de liberalismo moral e, por outro lado, eminentemente favorável ao aborto e à pílula.
Eis como lhe respondi: "O corpo não tem direitos, mas funções. É à alma que pertence coordenar essas funções com vista a realizar um equilíbrio ótimo entre a vida animal, a vida espiritual e as exigências do meio social. Que isso implica uma parte de violência em relação às pulsões carnais, é algo a que dou o meu acordo sem receio. E também concordo que certas castidades mal integradas provocam recalcamentos. Mas o recurso ao aborto ou à pílula, que você preconiza, como contrapartida da liberdade sexual, não é também um atentado contra esses famosos "direitos" do corpo? É a carne que reclama a interrupção da gravidez ou o impedimento da fecundidade? Pelo contrário, ela só quer levar até ao fim o processo natural que vai da união conjugal ao nascimento. Não, essas intervenções mutilantes procedem de um frio cálculo do espírito, ávido de tirar do corpo o máximo de gozo, sem ter em consideração as consequências naturais do prazer. Nesse caso, intervenção por intervenção, prefiro a da moral sexual..."
Assim, como quer que se proceda, nunca se escapa ao domínio da alma sobre o corpo. Todo o problema está em saber qual o sentido em que esse domínio se exerce.
Mens sana in corpore sano (alma sã em corpo são) --- diziam os antigos. Sabemos demasiado bem que as doenças da alma se repercutem sobre o corpo; por isso, é preciso velar pela saúde da alma, a fim de que ela tenha, em sentido contrário, as mesmas repercussões --- por outras palavras, substituir o psicossomatismo do erro e do mal pelo da verdade e do bem.
Fonte: viriatos.blogspot.com
Artigo original em francês:
"Le psychosomatisme" - Revista "Itinéraires" (Billets - 22 octobre 1976)