quinta-feira, 22 de abril de 2010

Aforismos

Os costumes, o espaço e o tempo

Os costumes, os usos, etc... eram outrora muito variados no espaço, mas estáveis em duração: assim, cada província tinhas os seus usos, a sua língua, os seus trajes, a sua cozinha, mas estas coisas perpetuavam-se por séculos. Hoje, pelo contrário, tudo tende a uniformizar-se no espaço (modas, cozinha standard, etc.), mas essa variedade perdida no espaço volta a encontrar-se no tempo (sucessão de "modas" numa cadência cada vez mais acelerada). Acumulando, assim, a uniformidade e a instabilidade, atenta-se duplamente contra a obra de Deus: por um lado, suprime-se essa diversidade que é o reflexo da sua riqueza; por outro, essa resistência às mordeduras do tempo, que ó o reflexo da sua eternidade.

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Dinheiro e desprendimento

O homem que ama o dinheiro em si mesmo, é desprezível. Mas também se pode amar o dinheiro por aquilo que ele proporciona. Ora, no mundo moderno, a maioria dos prazeres e dos divertimentos do homem, desde o prazer de comer alimentos sãos até a embriguez do espírito (leituras, viagens, etc.), dependem do dinheiro. Para que os homens se desprendessem do dinheiro, seria necessário primeiramente criar-lhes as condições de existência que lhes permitissem, em larga escala, expandir-se carnal e espiritualmente sem terem de recorrer ao dinheiro. Assim, o camponês não tem necessidade de consultar a sua carteira para comer saudavelmente, receber os amigos, gozar da beleza da terra e das estações, etc... O mesmo não sucede com o habitante de cidades: a falta de dinheiro priva-o de quase tudo. Uma das mais horríveis taras da nossa civilização é que o homem não possa desprezar o dinheiro sem renunciar, ao mesmo tempo, aos demais bens da terra, e que, para isso, lhe não baste ter um coração bem ordenado, lhe seja ainda necessário ser santo!

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Mito da Fênix

Nele se encontra a última palavra do otimismo. Não é do fogo, nem mesmo do barro ou do esterco que renasce a ave maravilhosa; é da coisa estéril e morta por essência: da cinza. Deus renascerá, ainda, da mais vã das vaidades. Está fé me consola ao ver as almas dos homens converterem-se em pó.

Fonte: "O pão de cada dia" - Editorial Aster - Colecção Éfeso